‘Raul Seixas é considerado o pai do rock brasileiro, mas é muito mais que isso’, diz José Inácio Vieira de Melo, curador da Flipelô

Em depoimento à Revista O Odisseu, poeta José Inácio Vieira de Melo conta sobre a homenagem a Raul Seixas na Festa Literária Internacional do Pelourinho, a Flipelô.

À esquerda o, poeta José Inácio Vieira de Melo (Foto: Ricardo Prado)/ À direita, o cantor e compositor baiano Raul Seixas (Foto: Reprodução).

À primeira vista, a escolha de um astro do rock para ser homenageado numa festa literária possa ser um pouco equivocada. No entanto, isso se deve à nossa rasa concepção de que a literatura acontece apenas nos livros. Ao escrever composições icônicas da música brasileira, Raul Seixas fez literatura da melhor qualidade.

É isso que acredita o curador da Festa Literária Internacional do Pelourinho (Flipelô), o poeta José Inácio Vieira de Melo. Em depoimento exclusivo para a Revista O Odisseu, Inácio faz questão de relatar a proximidade de Raul Seixas com a literatura presente nos livros, especialmente com a literatura de Jorge Amado.

Raul Seixas é uma personalidade baiana, foi contemporâneo de Jorge Amado, tem uma profunda admiração por Jorge Amado. Chegou a dizer que se não fosse envolvido com a música, gostaria de ser escritor. Iniciou a sua vida como escritor e chegou a dizer que se não fosse o cantor que era, gostaria de ser Jorge Amado. Então, há motivo de sobra para ser homenageado.

José Inácio Vieira de Melo

Vale ressaltar que Raul buscou diversos caminhos antes de se reconhecer definitivamente na música. Ao completar o ensino regular, foi aprovado para os cursos de filosofia, psicologia e direito na Universidade Federal da Bahia, mas não trilhou o caminho acadêmico: a música falou mais alto.

Raul Seixas: ‘um artista que se jogava no abismo da arte’

Foto: Divulgação/Sylvio Passos (Reprodução)

Claro que a aproximação de Raul com o patrono da Flipelô, o escritor Jorge Amado, não é o único motivo pelo qual o compositor foi escolhido para receber a homenagem. José Inácio também fala da potência da música de Raul Seixas como fator decisivo para escolhê-lo.

Raul Seixas é considerado o pai do rock brasileiro, mas é muito mais do que isso. Raul Seixas é um artista que tem uma capilaridade imensa até os dias de hoje. [Isso] Desde quando iniciou sua trajetória lá nos anos 70, com um disco extraordinário chamado “Krig-Ha, Bandolo”, que fecha o álbum com a música “Ouro de Tolo”, onde ele faz aqueles questionamentos com uma poesia pulsante, viva e vivaz, podendo ser considerado um precursor do hip-hop, [com] muito texto e muitas inquietações e muitos questionamentos. Isso pauta toda a sua obra e toda a sua vida. Era um artista que não fazia concessões a absolutamente nada. Portanto, teve uma vida trágica também nesse sentido, por ser um sujeito que se jogava no abismo da arte.

José Inácio Vieira de Melo, poeta e curador da Flipelô.

De fato, a vida pública de Raul foi sempre cheia de acontecimentos intensos. Em plena ditadura militar, ousou levantar a bandeira da “Sociedade Alternativa” que incorporava conceitos do bruxo estadunidense Aleister Crowley. A composição chegou a levar Raul Seixas e seu amigo compositor Paulo Coelho ao exílio e tortura por parte dos militares. Na mídia, manchetes sensacionalistas sobre o consumo de drogas por Raul apareciam todos os dias.

A obra de Raul Seixas ‘extrapola as fronteiras brasileiras’

O poeta José Inácio Vieira de Melo. (Foto: Ricardo Prado).

José Inácio termina o depoimento dizendo que ficou imensamente feliz quando percebeu que a curadoria da Flipelô escolheu Raul Seixas como o autor homenageado da edição 2024. Além disso, lembra que um artista como Raul, que “extrapola as fronteiras brasileiras”, não recebe tanta honra quanto deveria. Inclusive, lembra que em sua cidade natal, Salvador, a homenagem se reduz a um viaduto.

Na capital em que ele nasceu, Salvador, a grande homenagem que se deu a Raul Seixas foi um viaduto. Curiosamente, um viaduto que tem um shopping center do lado e uma igreja neopentecostal do outro. Mas [ele] é um arco-íris da liberdade nesse meio de consumo e de cegueira religiosa.

José Inácio Vieira de Melo, poeta e curador da Flipelô.

A Festa Literária Internacional do Pelourinho, a Flipelô, acontece entre os dias 7 e 11 de agosto de 2024 no centro histórico da cidade de Salvador. Como de praxe, acontece na semana do aniversário de Jorge Amado e reúne diversos nomes da literatura nacional e internacional. Para mais informações, acesse o site!

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2 comentários em “‘Raul Seixas é considerado o pai do rock brasileiro, mas é muito mais que isso’, diz José Inácio Vieira de Melo, curador da Flipelô

  1. Angela Eça Eça de Oliveira Almeida Responder

    O Colégio Estadual Paulo Freire estará presente na Flipelô 2024. Ficamos muito mais felizes quando soubemos que Raul Seixas seria o homenageado, um homem decolonial que nunca se deixou seduzir pelo ouro social.
    Coletivo Empretecser o Modelo
    Jequié-BA

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