Ainda quando estava atuando como editora, Virginia Woolf desempenhou um ofício incomum para outras mulheres de sua época. O trabalho com a prensa e a composição dos tipos, através do qual formava-se o modelo de uma página por ser impressa, deixavam-na com as mãos trêmulas e sujas de tinta.
Introdução: Uma leitora, escritora e editora incomum
Conhecida por sua obra ficcional, dotada de experimentalismos e responsável por inovações estéticas que marcaram os modernismos em inglês e suas reverberações em outros contextos linguísticos e culturais por meio de suas traduções, Virginia Woolf também foi uma notória ensaísta, assídua escritora de cartas e autora de extensos diários que hoje possuem lugar de importância literária e interesse do público. Assim, sua obra de não-ficção, fortemente ligada ao conceito de life writing1, possui relevância similar a sua produção como romancista, contista e dramaturga. Trabalhos como Jacob’s room (1922), Mrs. Dalloway (1925) e The waves (1931) apresentaram uma série de técnicas narrativas inovadoras como o fluxo de consciência, o diálogo interior e a fragmentação da narrativa, características que se estendem a seu contexto estético, os modernismos de língua inglesa, que contam ainda com nomes célebres, como Katherine Mansfield, T. S. Elliot e James Joyce. Já em sua escrita não ficcional, cobriu desde críticas literárias a assuntos sociais e políticos. Nesta leva de produções, é possível citar dentre seus títulos mais difundidos, A room of one’s own (1929), em que escreveu sobre a condição feminina em meio às estruturas da sociedade inglesa, focando seus impactos na possibilidade de uma carreira literária, e também Three guineas (1938), em que expôs a relação entre patriarcado e militarismo. Sua obra não apenas alcançou sucesso comercial como continua a ser lida, servindo de inspiração para novos escritores.
Um ponto importante a se considerar é sua formação enquanto leitora, que a influenciou diretamente em sua dedicação à escrita. Apesar de não ter tido o mesmo acesso à educação superior que seus pares do sexo oposto, Woolf encontrou na biblioteca de seu pai, sob incentivo dele próprio, uma vasta quantidade de livros através dos quais conheceu os prazeres da leitura, defendidos por ela em vários ensaios voltados ao tema. Atenta aos movimentos e reflexos da leitura e da escrita em sua época e contexto sócio histórico, a escritora fez duras críticas ao ensaio enquanto gênero textual que, nos primeiros anos do século XX, deu lugar à ascensão de um posicionamento narcisista dos ensaístas, em detrimento do espaço dedicado ao compartilhamento proveitoso de ideias
(Woolf, 1905). Além disso, em sua concepção, havia uma clara separação entre o leitor comum (common reader) e o leitor crítico. Ainda assim, Woolf buscou com sua própria escrita ensaística atingir uma diversidade de públicos, especialmente a classe média, e não apenas o público distinto de classe alta. Compunha textos “informativos, espirituosos e conversacionais” (Garrity apud Dubino, 2010), partindo do pressuposto que o leitor comum era sempre um amador que necessitava de uma educação literária. Se por um lado, Woolf não repudiou completamente a cultura de massas como muitos de seus colegas modernistas, por outro, buscou suas próprias formas de distinção literária através da edição de sua obra, inclusive a ensaística.
Inseridos em um contexto de imprensa de consumo efêmero, os ensaios poderiam ter sido relegados ao mesmo lugar pouco nobre do texto jornalístico diário, não fosse o hábito de selecioná-los e publicá-los sob a forma de livros. Ao longo do século XX, antologias reunindo textos de diferentes autores com atividade na imprensa também fizeram parte da edição em língua inglesa, usualmente focando o mercado de massa, bem como seu uso em escolas e universidades. Woolf, no entanto, buscou dar alguns passos à frente de seus contemporâneos, produzindo ensaios que fugiram do modelo de resenha mais comumente visto e editando-os em livros que, desde sua confecção esteticamente bem cuidada, ainda que atrelada à uma produção manual, almejavam tornar-se itens de colecionador (Dubino; Pollentier, 2010).
Além dos dois ensaios longos supracitados, cuja produção trilhou caminhos particulares, a produção de Woolf para periódicos foi posteriormente selecionada e agrupada em coletâneas que tornaram-se bastante conhecidas, caso de The common reader (1925), única reunião de ensaios planejada e publicada pela autora em vida2. O recorte de textos apresentado nesta coletânea serve de exemplo para uma prática recorrente na escrita de Woolf conhecida como versioning, em que diferentes versões de um mesmo texto eram publicadas para atender a diferentes veículos, seus projetos editoriais e públicos (evidenciando ainda a influência ideológica em meio a cultura dos impressos), especialmente ao serem observados movimentos transatlânticos de circulação desses ensaios. Adicionalmente, pode-se pensar em uma prática de autoedição ao se considerar o movimento de passagem de uma mídia impressa (periódico) para outra (livro), em casos como On beeing ill (1930) e o próprio The common reader, e ainda a publicação de romances como Orlando (1928), cuja especificidade estética apresentaria empecilhos para sua edição, não fosse a existência da Hogarth Press, editora criada e mantida por Virginia ao lado de seu marido, Leonard Woolf.
Ainda sobre os ensaios, o versioning e a autoedição de livros, pode-se considerar que tais práticas permitiram aos textos uma nova existência na cultura escrita, em forma revisada e ampliada, reinseridos no mercado editorial e representando ainda uma manutenção da autoria e da distinção literária perante os leitores. Ao compreender que tais práticas carregam em si forte expressividade, devido à sua historicidade, revelando “além de um uso social ou pessoal do objeto por parte do leitor, uma poética do suporte por parte do autor e do editor” (Thérenty, 2020), podemos entendê-las como influências no processo de canonização da autora, processo este observado por investigadoras como Caroline Pollentier (2010). Soma-se a isso contextos de produção maiores que a trajetória pessoal de Woolf, como a inserção das mulheres no meio literário e sua relação com os periódicos e o mercado editorial.
Em 1904, a jovem Virginia, ainda solteira e assinando o sobrenome Stephen, começa sua colaboração de longa data com a imprensa inglesa. Foi como ensaísta que Stephen encontrou uma forma de estabelecer contato com aquele mercado, conquistar seus primeiros leitores e ainda buscar sua independência financeira, similarmente a outras jovens escritoras de sua época (Dubino, 2010). No entanto, seu caso ganha particularidade por anos depois, já casada, ter se tornado proprietária de seu meio de produção.
Após adquirir uma prensa manual, o casal Woolf instalou o equipamento na mesa da sala de jantar de sua residência em Richmond, na Inglaterra. O que começou como um hobbie em 1917, através do qual puderam publicar contos autorais e trabalhos de amigos, tornou-se nos anos seguintes um negócio responsável por, dentre outros projetos, publicar traduções pioneiras da obra psicanalítica de Sigmund Freud e de literatura russa. O trabalho, anteriormente uma distração para Woolf quando se sentia estressada pela escrita literária, tornou-se extenuante com a profissionalização da editora, sentimento expresso por ela em algumas de suas cartas, o que culminou em seu desligamento das atividades em 1938. Leonard, no entanto, deu continuidade ao trabalho ao lado de John Lehmann (outra personalidade de Bloomsbury) até 1946, quando a Hogarth se tornou um selo da Chatto & Windus, editora comprada após décadas pela Penguim Ramdom House.
Ainda quando estava atuando como editora, Woolf desempenhou um ofício incomum para outras mulheres de sua época. O trabalho com a prensa e a composição dos tipos, através do qual formava-se o modelo de uma página por ser impressa, deixavam-na com as mãos trêmulas e sujas de tinta. Uma tarefa árdua, manual, minuciosa e que envolvia um maquinário complicado e pesado dificilmente poderia ser associada a uma senhora pertencente às camadas mais privilegiadas da sociedade inglesa. Embora não fosse a única a desempenhar tal função, visto o papel que outras mulheres editoras e impressoras desempenharam aproximadamente no mesmo período, é fato reconhecido pela própria escritora que ao poder desempenhar tal função, embora ainda sujeita a autocensura3, teve sob as mãos a liberdade de publicação que tanto sonhara e sem a qual dificilmente teria materializado suas obras inventivas, distintas dos padrões da literatura realista dominante na virada entre os séculos XIX e XX.
O papel da autoedição para a liberdade de publicação de Woolf
Como pontua D. F. McKenzie, ao nos movermos em direção aos aspectos materiais do livro, nos colocamos diante de questões quanto ao contexto autoral, literário e social, as quais “influenciam as maneiras nas quais os textos são então relidos, reeditados, redesenhados, reimpressos e republicados” (2018). Esta relação entre os textos literários e sua materialidade, inclusive no que concerne às práticas de edição empreendidas na publicação de livros é sabidamente relevante para se pensar nos modernismos de língua inglesa, que tomou forma no mundo anglo-americano, com destaque para a Inglaterra, nos primeiros anos do século XX. Como parte deste contexto, Virginia e Leonard Woolf foram figuras centrais para a publicação de obras vanguardistas, a princípio centradas em seu círculo de amigos, todos habitantes do bairro londrino de Bloomsbury. A primeira publicação do casal foi um pequeno livro contando com um conto de cada. Dali em diante, Woolf utilizaria da editora para lançar ela mesma seus livros. Não coincidentemente, seu primeiro romance modernista, afastado da estética realista ainda dominante, foi Jacob’s room, publicado em 1922, annus mirabilis para o movimento estético que se consolidaria nos anos seguintes.
Há três casos notáveis que demonstram a liberdade de criação de Woolf, que compreendia não apenas a criação literária, mas também a edição na Hogarth – são as já citadas publicações de Orlando, On beeing ill e The common reader. Nos três, torna-se evidente como a relação entre sua atividade como editora de seus próprios livros foi determinante para que pudesse concretizar seu projeto enquanto escritora, desde a composição de seus textos, incomuns para os padrões de sua época, até sua apresentação material, responsáveis por promover a interseção entre literatura e artes visuais como partes intrínsecas de uma narrativa, ou elevar a produção ensaística, até então efêmera e vista como menor, ao status de alta literatura, onde não somente os textos ganharam uma nova roupagem através de um distinto projeto gráfico, como também puderam ser retrabalhados pela autora, livre das limitações dos periódicos e seus padrões editoriais.
Objeto de investigação de Leite e Viana (2020), Orlando apresenta mais que uma história fantástica, onde um jovem inglês imortal transforma-se em mulher. Na narrativa, uma paródia do gênero biográfico, as imagens apresentam uma função que vai além da mera ilustração. Nesse sentido, o teor paródico não se resume às escolhas estilísticas feitas pela autora, mas estendem-se às nove imagens presentes em meio ao texto, entre pinturas a óleo e fotografias, das quais oito foram reproduzidas da edição da editora brasileira Autêntica. A suposta relação referencial das imagens (com destaque para a fotografia) e os 350 anos narrados, é tanto quebrada quando reforçada devido à: 1) não corresponderem à uma personagem e fatos reais e 2) entrelaçarem verdade e ficção ao referenciarem de forma bastante direta a vida de Vita Sackville-West, poetisa inglesa e amante de Woolf que foi inspiração para Orlando – há retratos de Vita que servem como retratos de Orlando após sua mudança de sexo, e mesmo os quadros a óleo (ao menos, na edição da autora) eram, em sua maioria, propriedade da poetisa. O primeiro deles, visto na edição da Autêntica com a legenda “Orlando quando menino”, retratava, na realidade um antepassado da família de Vita, Edward Sackville, mantendo assim uma relação de parentesco entre inspiração/ biografia real e personagem/ biografia paródica.
Além de apontarem a relação verbovisual entre imagem e narrativa literária, Leite e Viana apontam como os custos de impressão de imagens teria dificultado a publicação caso esta fosse submetida a uma editora comum. Ao atentarem-se para o movimento no mercado brasileiro, em que tais imagens só passaram a ser incluídas a partir da edição e tradução de Tomaz Tadeu, as autoras chamam a atenção para o apagamento promovidopor uma decisão que pode ter tido como motivador o fator econômico, mas que não deixa de levantar questionamentos quanto a leitura feita à época de publicação das edições e traduções anteriores que levara também à supressão de outros paratextos editoriais.
Os casos das publicações de ensaios pela Hogarth apresentam outras questões que, a seu modo, mostram a percepção de Woolf quanto a sua própria colocação no mercado editorial. On being ill foi escrito logo após as publicações da coletânea The common reader e do romance Mrs. Dalloway, em 1925, e teve como motivação um período de doença enfrentado pela escritora ao longo de cinco meses. Ela enviou o ensaio a um de seus colegas, o poeta T. S. Elliot, que contribuiu para que o texto fosse publicado pela primeira vez no periódico New Criterion, em janeiro de 1926. Anos mais tarde, em 1930, uma tiragem de 250 cópias do ensaio foi impressa pela Hogarth Press, demonstrando o interesse de Woolf em se promover-se como crítica literária e ensaísta.
Vendido por 21 xelins, “On Being Ill” apresentou Woolf como uma autêntica editora de sua própria obra. A materialidade deste ensaio de trinta e seis páginas sob a forma de livro, cuja composição tipográfica foi feita por ela mesma, contrastava nitidamente com o típico ensaio “middle” moderno, reimpresso em coleções: sua luva pictórica e páginas de guarda marmorizadas, e ainda a assinatura de Woolf em tinta púrpura, marcaram-no como um item colecionável de alta cultura. A resenha de A. S. McDowall no TLS elogiou-o como tal, e a própria Woolf mencionou seu valor adicional a um leitor que reclamou sobre a impressão do livro.4 (Pollentier, 2010, p.142)
(Continua após as imagens)
Capa (luva) da publicação original de On beeing ill pela Hogarth Press, com design de Vanessa Bell (1930). Disponível em: https://www.jonkers.co.uk/rare-book/409/on-being-ill/virginia-woolf. Acesso em 28 nov 2023
Capa (luva) da publicação original de On beeing ill pela Hogarth Press, com design de Vanessa Bell (1930). Disponível em: https://www.jonkers.co.uk/rare-book/409/on-being-ill/virginia-woolf. Acesso em 28 nov 2023
Visão interna do livro, onde constam informações da edição. É visível um erro de tipografia, onde foi indicado a quantidade de 125 cópias, a qual foi corrigida com a inclusão do número 250 logo acima. Na indicação do número do volume em questão, Leonard Woolf escreveu “Fora de série”. Abaixo, há a assinatura de Virginia Woolf em tinta púrpura.
Woolf produziu outros volumes como On being ill, sempre com textos que fugiam do padrão de resenha do literary journalism para que produzia para veículos como a Times Literary Suplement (TLS). Ainda assim, mostraria sua habilidade para a compilação de seus próprios textos ao planejar ao longo de alguns anos aquele que seria um de seus marcos de popularidade editorial, pensado em uma chave oposta àquela vista na produção limitada supracitada. Em The common reader, publicado em dois volumes, o primeiro em 1925, o segundo em 1932, a autora reflete sobre sua grande paixão, a leitura, sendo este o tema “guarda-chuva” que une todos os ensaios, alguns inéditos, outros anteriormente publicados na imprensa, sobretudo nas páginas do TLS, onde tradicionalmente, os textos, resenhas de livros em sua maior parte, não possuíam a assinatura dos autores. No segundo caso, tais ensaios passaram por grandes mudanças em seu conteúdo, versionados de maneira a ampliar as exposições e o pensamento de Woolf sobre temas voltados à ou inspirados pela literatura, como as características da ficção moderna, a autoria feminina, marcada por nomes como Jane Austen, Charlote e Emily Brönte, bem como aqueles quase instrucionais, como How should one read a book?
Aqui, a prática de versioning toma proporções ainda maiores que aquelas vistas quando, para adequar-se a diferentes públicos e periódicos, Woolf promovia mudanças em seis textos. Isto porque trata-se de sua versão livresca, com a autonomia proporcionada pela Hogarth e a liberdade de tornar tais textos aquilo que a autora gostaria que eles fossem, sem os limites impostos pelos editores de jornais e suplementos literários. Com tal trabalho, pôde ainda revisitar textos quando parte de seus interesses haviam mudado – como no caso de Emily Brönte, que ocupara o lugar antes exclusivo da irmã Charlote na investigação de Woolf. Por fim, a organização e publicação de coletâneas, com novas versões dos ensaios, demonstra uma busca da autora pelo controle de sua marca autoral. Ao investir na curadoria dentre os numerosos ensaios publicados, com fortes marcas do tempo e influenciados pelos projetos editoriais dos periódicos de “origem”, não somente os ensaios puderam ganhar mais resistência à temporalização, como puderam ser afirmados como parte da obra da autora. Devido à escolha pelo agrupamento dos ensaios em coletâneas, podemos ainda comparar tal prática com a antiga composição de miscelâneas, cujo efeito para a história da literatura foi a canonização de certos textos em detrimento do desaparecimento de outros, como expõe Joffrey Todd Knight (2013).
O fenômeno que o autor investiga em Bound to read, situado no período da Renascença, trata-se da prática de encadernação desempenhada pelos próprios leitores ao montar sua coleção de livros particular, junto da qual surgiu o costume de compilar
diferentes textos, seguindo seus próprios critérios e interesses. De acordo com Knight, o processo de canonização de autores como Shakespeare na cultura ocidental está ligado à sua inclusão nestas miscelâneas. Ou seja, há uma forte relação entre a canonização e a materialidade dos textos, sendo o prolongamento da vida editorial dos ensaios possível consequência da organização em coletâneas, ainda que considerada sua distinção da prática de compilação dos leitores renascentistas. O efeito da canonização marca a permanência dos textos de Woolf percebida ainda hoje no meio editorial quando estes despertam o interesse de um mercado que segue publicando-os e de um público que segue lendo-os e interpretando-os, tal como percebido em editoras como a Nós, que publica edições bilíngues de ensaios como Sobre estar doente (On being ill), Morte da mariposa (Death of the moss) e Pensamentos de paz durante um ataque aéreo (Thoughts on peace in an air raid), e a Tordesilhas, que recém publicou uma nova tradução de O leitor comum (The common reader).
Conclusão
Woolf foi, para além de uma célebre escritora, uma editora incomum, pois além de ocupar lugar privilegiado entre seus pares, considerando-se ainda as limitações para as mulheres escritoras de sua época, aproveitou do ofício, aprendido na prática à medida junto de seu marido, para prezar pelo experimentalismo e pela distinção literária. Compunha tipografias e imprimia novas edições de livros, dentre os quais os seus próprios, e assim, driblou imposições de editores que dificilmente lhe permitiriam publicar literatura de vanguarda, reapresentou aos leitores ensaios que possivelmente teriam sido esquecidos, a despeito de qualquer argumento sobre sua qualidade textual, e compilou textos que, após passarem por grandes intervenções, serviram como forma de afirmar sua própria autoria.
A importância em ocupar tanto o lugar de autora quanto de editora e, assim, exercer a prática da autoedição, mostra-se não somente um marco na história pessoal de Woolf como também do modernismo inglês, representado destacadamente pelo grupo de Bloomsbury, e este espírito ainda hoje reverbera em autores, editores e projetos editoriais de proporções variadas, como a Mimo, sob coordenação do próprio tradutor responsável pelas obras, Tomaz Tadeu, provando que ao se tratar de edição o encontro entre mão e mente55 pode ser a chave para que a mágica aconteça.
*Texto publicado originalmente no Seminário de Literatura Comparada: Transmissão Literária e Materialidade dos Textos do Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários (Pós-Lit) (UFMG)
Referências
Dubino, Jeanne (org). Virginia Woolf and the Literary Marketplace. Palgrave McMillan, 2010.
Knight, Jeffrey Todd. Bound to read: compilations, collections and the making of renaissance. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2013.
Leite, Marília Dantas Tenório; Viana, Maria Rita. Orlando em traje de gala: a performance das imagens na biografia paródica de Woolf, em edição de Tomaz Tadeu (2015). Em Tese, Belo Horizonte, v. 26, n. 1, jan-abr 2020.
McKenzie, Donald Francis. Bibliografia e a Sociologia dos textos. São Paulo: Edusp, 2018.
Pollentier, Caroline. Virginia Woolf and the Middlebrown Market of the Familiar Essay. In: DUBINO, Jeanne (org). Virginia Woolf and the Literary Marketplace. Palgrave McMillan, 2010.
Thérenty, Marie-Ève. Por uma poética histórica do suporte. Tradução: Bruno Guimarães Martins. Animus. Revista Interamericana de Comunicação Midiática, Santa Maria, v. 19, n. 41, p. 351-358, 2020.
Woolf, Virginia. The decay of essay writing. 1905. Disponível em: https://commonreader.wustl.edu/c/essay-month-modern-essay/. Acesso em 27 jul. 2023.
Woolf, Virginia. Um teto todo seu. Tradução: Bia Nunes de Sousa. São Paulo: Tordesilhas, 2014.
Leia Também: O ato final de Yukio Mishima.
- As correspondências deste conceito na língua portuguesa incluem, usualmente, “escritas de vida”, “documentos do eu” e “escritas de si”. ↩︎
- Outros títulos similares, como Death of the moss and other essays foram publicados postumamente, com organização de Leonard Woolf. ↩︎
- Sobre este fenômeno, provocado não menos por sua própria psique – representada pela figura a qual chamava de “anjo na casa” (Angel in the house) – como ainda pelas leis vigentes na época – o Obscene Publications Act de 1857, o National Vigilance Association, de 1885, e o National Social Purity Crusade, de 1901 – ver: NEVEROW, Vara. Woolf’s Editorial Self-Censorship and Risk-Taking in Jacob’s Room. In: DUBINO, Jeanne (org). Virginia Woolf and the Literary Marketplace. Palgrave McMillan, 2010. ↩︎
- Tradução nossa. No original: “Sold at the cost of 21s, “On Being Ill” involved Woolf as an actual publisher of her own work. The materiality of this thirty-six-page essay in book form, which Woolf typeset herself, stood in sharp contrast with the typical modern middle, reprinted in collections: its pictorial dust jacket and marbled end-papers, and Woolf ’s signature in purple ink, all marked it as a collectable item of high culture.
A. S. McDowall’s review in the TLS praised it as such, and Woolf herself mentioned its added value to a reader who complained about the printing of the book”. ↩︎ - Como no título do livro de Roger Chartier, A mão do autor e a mente do editor (2014). ↩︎