Em “poeformance &”, Alex Simões surge desnudo de estruturas formais para convidar seu público a uma imersão de sentimentos que nos faz refletir sobre nossas identidades e o espaço urbano.
Aos estribilhos de uma voz que ressoa atenta e desperta e ora nos confunde com o poeta, ora com o performer em cena, ou talvez com um ator e, em outros momentos, com a junção de tudo isso, Alex Simões brada seu onirismo racional poético que conclama as ruas, a religião, a urbanidade, uma Salvador para além do cartão-postal, em versos faiscantes que, em sua voz, ganham uma extensão anárquica e deliciosamente caótica. Misturando seus versos aos de outros poetas, nos brinda com uma paisagem imagética estruturada em poemas de palavras afiadas e contestadoras, um suspiro corajoso para os dias de hoje, em que muitos discursos têm a pretensão do “bom mocismo” e da tentativa de ser autoajuda. A poesia não escapou de ser hackeada para o mundo onde se lucra com a simplificação de problemas complexos e sua superficialização que busca soluções irrealistas. Hoje, um mercado multimilionário nos faz deparar com frases de efeito disfarçadas de poemas, leituras capazes de danificar o cérebro e causar um movimento peristáltico no estômago.
Em “poeformance &”, Simões (junto aos excelentes músicos Ricardo Caian – guitarra e samplers – e Ivan Huol – bateria) surge desnudo de estruturas formais para convidar seu público a uma imersão de sentimentos que nos faz refletir sobre nossas identidades e o espaço urbano, cada vez mais tomado por lógicas e estruturas que contemplam menos a usabilidade prática e cada vez mais apenas uma decoração, às vezes inalcançável para muitos. Alex reflete sobre a cidade que requer carros blindados, vidros fechados, das poças de lama em dias de chuva que respingam em quem tem a rua para andar. O individualismo cada vez mais plantado em nossas condutas e estimulado por um sistema que trafega para nos desaproximar do essencial e objetivar o fútil. Nesta paisagem, o performer bate em suas teclas numa máquina de escrever que acompanha os compassos de seus músicos em cena, tudo muito engrenado com as falas de Alex. Uma “poesia performática” ou “poesia de performance”, que se dá diante de nossos olhos em uma expressão cênica única.
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Se um poeta pode fingir o que sente, ele pode também fingir que é ator, músico, performer, percussionista, um mestre de cerimônias. Alex faz tudo isso com rasgos viscerais de sua poesia que, no palco, às vezes se transmuta em teatro, música e qualquer outra linguagem que o poeta em cena decida ali naquele momento ou talvez tenha combinado previamente. Imagine que numa quarta-feira com o céu desabando de água, dessas chuvas que Salvador nos “brinda”, Alex consegue reunir no Espaço Cultural Casa Preta um público pagante que logo chega e enche a sala, todos muito bem advertidos pelo poeta que não há regras ou formalidades — pode levantar, pode ir ao banheiro, pode ir beber, pode fumar. Curiosamente, mesmo com essa liberdade concedida pelo artista-poeta-performer em cena, ninguém levanta até o fim. Em alguns momentos, parece evocar um Wally Salomão no auge da geração beat, de sua poesia total, quase um “Me segura que eu vou dar um troço”.
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