Em seus novos livros, Mar Becker e Adelaide Ivánova exploram a resiliência feminina através da poesia. As duas poetas participaram da mesa ‘Asma, boca e cova profunda’ n’A Feira do Livro 2024.
Na tarde do último domingo (30), no segundo dia da Feira do Livro, o auditório Armando Nogueira foi palco da mesa “Asma, boca e cova profunda”, reunindo as poetas Adelaide Ivánova e Mar Becker.
A conversa, mediada por Irene de Hollanda, mergulhou nos temas presentes em seus mais recentes livros de poesia: “Asma”, publicado pela editora Nós, e “Cova profunda é a boca das mulheres estranhas”, pela Círculo de Poemas.
“Asma” narra a história de Vashti Setebestas, uma mulher de 3 mil anos de idade que se volta contra a repressão estatal e as histórias criadas pelos homens.
Já “Cova profunda é a boca das mulheres estranhas” é sobre as resistências silenciosas de mulheres diante de uma forte religiosidade.
Cada livro, à sua maneira, parece emergir de um trauma coletivo que paira sobre a vida de incontáveis mulheres, acompanhando-as por gerações de forma estrutural e, por vezes, até mesmo “hereditária”.
Como apontado pela mediadora, ambos os livros exploram uma “genealogia das mulheres insubordinadas”, que, por meio de suas vivências, resgatam as histórias daquelas que foram silenciadas e apagadas pelo tempo — seja pela opressão do aparato burocrático e estatal, seja pelos próprios parceiros dentro de seus lares conjugais.
Ao responderem uma pergunta sobre como foi o processo de concepção desses livros e de suas personagens, as poetas disseram que buscaram inspiração em suas próprias vivências, famílias, origens e histórias.
Mar Becker destacou a importância da escrita no processo de trazer à luz o que muitas vezes foi sufocado ou jamais comentado, e que eventualmente se torna lenda ou tabu.
Praticamente todo âmbito familiar esconde algum segredo, originado de um trauma ou um incidente carregado por gerações e que, apesar dos esforços de muitos para abafá-lo, sua presença incômoda segue viva no inconsciente coletivo. Isso, inclusive, se confunde com a história do nosso próprio país.
A angústia de não ter justiça ou sequer respostas para algo tão íntimo é uma sombra na vida de inúmeras mães, filhas e netas espalhadas pelo mundo.
Narrar essas histórias, portanto, desempenha o papel crucial de evidenciar o quão corriqueiras elas ainda são.
Para as leitoras, a poesia serve como um alento agridoce, mostrando que essas situações não são isoladas e que, ao mesmo tempo, elas não estão sozinhas.
Para as poetas, o exercício da escrita também acaba por remediar suas próprias almas afligidas.
Porque preservar a memória e reafirmar a existência dessas mulheres talvez seja uma das poucas maneiras de reparar as injustiças que há muito foram cometidas.
Sobre o autor convidado
João é redator, amante de tecnologias analógicas e cinéfilo irremediável. Antes de fazer da escrita sua profissão, já a cultivava como hobby, buscando em ambas as formas apenas uma coisa: existir.
Confira os livros das autoras da mesa ‘Asma, boca e cova profunda’
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