‘Melhor pra quem?’: Resenha de ‘Melhor não contar’, de Tatiana Salém Levy

“Melhor Não Contar”, de Tatiana Salem Levy, é uma leitura provocativa que desafia o leitor a refletir sobre o peso do silêncio imposto às mulheres e os diversos traumas que elas enfrentam.

A autora Tatiana Salem Levy, autora de ‘Melhor Não Contar’ (Todavia, 2024)/ Foto: Ana Branco (Todavia/Divulgação)

O novo livro de Tatiana Salem Levy, “Melhor Não Contar”, aborda temas profundamente relevantes e complexos. Ao ler o título, você já consegue imaginar o assunto central do livro: um dilema que muitas mulheres enfrentam ao compartilhar experiências de assédio, frequentemente recebendo o conselho: “Melhor Não Contar”. No entanto, a questão que persiste é: melhor para quem?

Tatiana narra o impacto do silenciamento imposto às vítimas de assédio e o fardo esmagador de manter tais segredos. O livro explora não apenas esse tema, mas também outros tópicos pesados como estupro, aborto, violência emocional, doença terminal e luto. Em suas 224 páginas, a autora provoca reflexões profundas e questionamentos inquietantes. Um dos questionamentos constantes que ela relata ter ouvido de cada pessoa para quem apresentou o livro antes do lançamento foi: “Para que se expor tanto?” Ela responde:

“Aos poucos fui entendendo que nunca me identifiquei com essa pergunta, porque quando escrevo não se trata de expor os fatos de uma vida. Nunca tenho a sensação de estar me desvendando aos outros. Escrever é muito diferente de contar um segredo a uma amiga. Nunca, mesmo quando me expus, tive a sensação de estar me expondo. (…) Escrever não é fazer fofoca. Nem simplesmente contar o que aconteceu.”

A narrativa traz referências a autores renomados, como Annie Ernaux ao relatar o aborto, fatos históricos como a Ditadura e as primeiras eleições Diretas após esse período, e personalidades da classe artística nacional, como é o caso do cineasta, o padrasto, o homem que deixou ela presa em um segredo.

De mãe para filha

A história é situada em um ambiente que lembra os dramas de Manuel Carlos, com cenas marcantes, o barulho do mar, bossa nova ao fundo e viagens ao exterior. Em uma passagem, ela escreve sobre a mãe: “A dor fica mais evidente no segundo diário, escrito enquanto minha mãe viajava pela Europa em férias escolares.

Essa perspectiva do livro é interessante, pois a autora intercala a narrativa com páginas do diário de sua mãe, escrito durante a adolescência. Esses trechos revelam uma jovem dramática, apaixonada por amores impossíveis, lidando com uma mãe complicada e distante. Durante a leitura, tive a impressão de que a autora tem uma certa fixação pela mãe e por repetir suas histórias, mas acho que poderia ter explorado mais a mãe que foi correspondente de guerra e viveu no exílio por conta do marido filiado ao partido comunista. Durante a adolescência, essa mãe era uma legítima adolescente.

Essa estrutura, embora atrativa – afinal, quem nunca quis espiar o passado de sua mãe, conhecer seus pensamentos e vivências durante a adolescência? – pode parecer confusa e repetitiva em alguns momentos. A autora compartilha eventos significativos de sua vida, desde assédio até luto, mas a ausência de uma linearidade clara pode deixar o leitor com a sensação de que algo está faltando. As informações, embora poderosas, às vezes parecem desconectadas, deixando um desejo por uma coesão maior na narrativa.

“Melhor Não Contar” é uma leitura provocativa que desafia o leitor a refletir sobre o peso do silêncio imposto às mulheres e os diversos traumas que elas enfrentam. Ao final, percebemos que a resposta para a pergunta inicial – melhor para quem? – é a chave para entender a profundidade e a urgência das histórias que Tatiana nos conta.

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