Exposição ‘Um Defeito de Cor’ reabre as portas do Museu Nacional de Cultura Afro-Brasileira em Salvador com uma viagem pela multiplicidade diaspórica

Exposição ‘Um Defeito de Cor’, reúne no prédio do MUNCAB mais de 370 obras de artistas diversos, como Pierre Verger, Márcio Vasconcellos, Carybé e Tiago Sant’Ana.

Obras de Benedito José Tobias (Data desconhecida) exibidas no MUNCAB/ Foto: Marcus Vinicius Rodrigues

Depois de três anos fechado, por conta da Pandemia da Covid-19, o Museu Nacional de Cultura Afro-brasileira, o MUNCAB, reabriu as portas em Salvador! Para celebrar esse novo ciclo, a Direção do Museu trouxe para a Bahia a exposição “Um Defeito de Cor”.

A exposição tem inspiração na obra homônima de Ana Maria Gonçalves, que também é uma das curadoras da exposição junto a Marcelo Campos e Amanda Bonan. Para Ana Maria, trazer a exposição para Salvador é como “voltar para casa”.

A autora esteve no MUNCAB no último dia 6 de novembro para o lançamento da exposição e também reabertura do prédio. Na ocasião, ela aproveitou para falar sobre a continuidade da discussão sobre a diáspora que se iniciou com o lançamento de “Um Defeito de Cor” e celebrou a escolha da Portela por representar o romance no desfile do Carnaval 2024:

“Outra coisa que está me deixando muito alegre, o livro é tema do desfile da Portela agora em 2024[…] Existem tantos ‘Defeito de Cor’, tantos livros quantos são os seus leitores ou quanto são as pessoas que conversam com ele através de outras artes. E ao se multiplicar, ele volta para mim de uma maneira completamente diferente do que eu conhecia, então ele continua me transformando”.

Ana Maria Gonçalves, durante o lançamento da exposição “Um Defeito de Cor”, no MUNCAB, em Salvador (06/11/2023)

Não é difícil concordar com o que disse Ana Maria. “Um Defeito de Cor” é clássico e é principalmente por essa continuidade do diálogo com as demais formas de artes e por todas as discussões fomentadas por ele. A exposição é um exemplo perfeito disso.

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Uma viagem pela história de cor preta

Da esquerda para a direita: a fotografia “Fluxo e Refluxo (Barco de Açúcar)”, de Tiago Sant’Ana e a ilustração “Barco de Santo”, de Pandro Nobã/ Fotografia: Ewerton Ulysses Cardoso

Ao entrar na área da exposição, nos deparamos com uma fotografia belíssima de Tiago Sant’Ana. É também a fotografia que está na página inicial do site da exposição e impressa num banner gigante em frente ao museu. Estou falando da obra “Fluxo e Refluxo (barco de açúcar)”.

Não poderia ser uma escolha melhor para iniciar a jornada, pois faz referência à própria diáspora, ao cruzar dos navios pelo oceano Atlântico, ora trazendo negros para serem escravizados, ora levando o açúcar.

É de se pensar que uma atrocidade tão grande como a escravidão foi utilizada para produzir o açúcar, alimento “de luxo” (à época), responsável por adoçar a vida dos algozes e amargar a vida do povo africano.

Seguindo o trajeto, encontramos ilustrações que fazem referência aos povos originários brasileiros, fotografias que expressam a religiosidade afro-brasileira e outras que contam a história dos movimentos sociais pelos direitos da população negra no Brasil.  

É o exemplo da fotografia “Abdias Nascimento discursa em Peregrinação do Memorial Zumbi à Serra da Barriga” (1983), de Elisa Larkin Nascimento, certamente uma das mais potentes da exposição.

A exposição ainda traz fotos do nigeriano Iké Udé e do antropólogo franco-brasileiro Pierre Verger. Além de gravuras e ilustrações da baiana Yedamaria, do argentino Carybé e muitos outros (a exposição é riquíssima).

Isso sem falar de instalações artísticas que tentam reconstruir o cenário do Brasil Colônia e fazer releituras artísticas de temas relacionados à diáspora e ao próprio livro de Ana Maria Gonçalves.

Trazer os elementos do período colonial, mas também dialogar com os movimentos sociais urbanos e contemporâneos é explicitar o quanto a diáspora é diversa. Os africanos em diáspora se espalharam pelo mundo produzindo arte, cultura e intelectualidade. Nesse ponto, acho importante dizer que toda a multiplicidade da pessoa negra foi exposta.

O Ponto Alto da Exposição

“Zeladores de Vonduns”, fotografias de Márcio Vasconcelos/ Foto: Marcus Vinicius Rodrigues

No segundo andar do MUNCAB, podemos encontrar uma série de fotografias que, para mim, fizeram o ponto alto da exposição. Claro que não sou nenhum especialista em arte, tampouco em fotografia, mas os portraits de Márcio Vasconcelos da exposição “Zeladores de Voduns: A Saga de uma Rainha Negra” são impressionantes.

As fotografias buscam retratar a saga da família real do Daomé (que hoje é o Benim) pelo viés da religiosidade, do Vodum. São fotos envoltas de mistério e magia que apresentam o sagrado sob a ótica africana e como isso chega à diáspora. A exposição de Vasconcelos foi vencedora do Prêmio Nacional de Expressões Culturais Afro-Brasileiras. Inclusive, você pode ler mais sobre essa exposição e ver algumas de suas fotos no site do artista.

Sobre o MUNCAB

O Museu Nacional de Cultura Afro-Brasileira é uma realização da Prefeitura de Salvador em parceria com a Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI) e conta com a co-realização do Museu de Arte do Rio, o MAR.

A direção artística do Museu é Cíntua Maria e Jamile Coelho. Para além da exposição, o MUNCAB conta com um acervo permanente com obras do Mestre Didi e de Yedamaria. Fica próximo à Praça Castro Alves, pertinho do Cinema Glauber Rocha, na capital baiana. Não preciso nem dizer que super vale a visita!

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